6.9 – Os Géis Considerados como Sólidos Não-Cristalinos

Géis são estruturas sólidas com uma fase líquida presa à fase sólida. Nos aerogéis, a fase aprisionada é um gás. Recentemente a agência espacial norte-americana NASA utilizou um aerogel de sílica para capturar partículas da cauda de um cometa (1) (Figura 6.o). Tipicamente, géis formam-se quando partículas sólidas em suspensão coloidal (2) se unem numa armação sólida que encerra o líquido. O fato notável nos géis é que a fração volumétrica da fase sólida é muito pequena (1-2% na gelatina) em relação ao volume final do gel (Figura 6.p), mas consegue reter e imobilizar uma grande quantidade de líquido. A classificação usual dos géis é semelhante à dos sólidos não-cristalinos. A armação sólida que imobiliza o líquido pode ser composta de moléculas aderidas fisicamente entre si por forças de contato, caso em que o gel é chamado gel elástico. Ou então, a armação é uma rede tridimensional com a ligação entre os pontos podendo ser de natureza química (covalente, iônica, ponte de hidrogênio), e o gel é dito gel rígido. Em geral, géis elásticos dissolvem-se em suspensões por esforço mecânico ou aumento de temperatura, porque as ligações entre as partículas, ou moléculas, são relativamente fracas e são rompidas pela agitação mecânica e/ou térmica. Géis rígidos são mais parecidos com os materiais poliméricos em rede tridimensional (veja Tópico 6.8), no sentido que não amolecem apreciavelmente quando a temperatura aumenta, pois a ligação entre os pontos da estrutura sólida tridimensional pode ser química.
O exemplo mais conhecido de um gel elástico é a gelatina que é utilizada em doces, sobremesas, musses, etc. Na gelatina, a armação sólida é composta de moléculas de proteína de cadeias longas (colágeno) que retêm a água entre elas. A ligação entre as moléculas de colágeno é de contato. Outro exemplo de um gel elástico é o gel de celulose, que se produz durante a confecção de celofane. Uma das etapas da fabricação de celofane envolve precipitação de celulose a partir da solução aquosa de seus compostos; o gel resultante é um arranjo tridimensional de cadeias de celulose, no qual se podem encontrar regiões cristalinas atuando como reticulações e a água como plastificante, separando as cadeias umas das outras. Nas operações subseqüentes do processo de fabricação, seca-se o gel elástico de celulose, substitui-se então a água por glicerol, como plastificante, produzindo-se uma película de celofane mais tenaz e menos elástica.
Outro exemplo de gel elástico é o asfalto, uma combinação de hidrocarbonetos de alto peso molecular num solvente oleoso. Os hidrocarbonetos de alto peso molecular que formam a armação sólida do gel são chamados de asfaltenos. À temperatura ambiente, o asfalto é muito viscoso, mas, mesmo assim, está acima da sua temperatura de transição vítrea (Tg) e se comporta como uma suspensão. Somente se o resfriarmos a temperaturas abaixo da sua Tg é que ele se transformará em um gel com uma rede de partículas de hidrocarbonetos de alto peso molecular.
A sílica-gel é um dos exemplos mais simples de gel rígido. É produzida polimerizando-se moléculas de ácido silicílico, fórmula geral dissolvidas em água, numa rede tridimensional de sílica altamente porosa (3) com uma grande área específica (a área de uma grama de sílica-gel pode medir aproximadamente 800 ). Outro gel rígido, o gel concreto feito com cimento Portland, é um importante material de engenharia; e é produzido durante a reação do cimento com água (pega ou reação de hidratação do cimento). O cimento seco e finamente moído contém quatro compostos principais :
silicato tricálcico
silicato dicálcico
aluminato tricálcico
aluminato de ferro tetracálcico

Quando esse cimento é misturado com água, a hidratação, ou absorção de água, produz um gel composto principalmente de silicatos de cálcio hidratados, com fórmulas que se representam aproximadamente por
.
Como esta é aproximadamente a fórmula do mineral torbermorita, o gel é chamado gel de torbermorita (Figura 6.q). A parte de silicato do gel é semelhante a um silicato em camadas (Veja Capítulo 3, Tópico 8, Figura 3.y), com os íons de Ca e O entre as camadas do silicato. As moléculas de água são adsorvidas nas superfícies dessas camadas e os separam no gel. Uma vez que este gel é formado, ele se une às outras partículas no agregado, formando uma massa rígida que dá “pega”. A massa então endurece mais, à medida que a hidratação progride para o centro de cada partícula.

Figura 6.o – Aerogel de sílica utilizado pela agência espacial norte-americana NASA para capturar partículas da cauda de um cometa.

Figura 6.p – Representação da estrutura de um gel.

Figura 6.q – Concreto (gel de torbermorita)