3.1. Introdução

Estruturas cristalinas são arranjos regulares, tridimensionais, de átomos no espaço. A regularidade com que os átomos se agregam nos sólidos decorre de condições geométricas impostas pelos átomos envolvidos, pelo tipo de ligação atômica e pela compacidade. Essas estruturas cristalinas observadas nos sólidos são descritas através de um conceito geométrico chamado rede espacial, e podem ser explicadas pelo modo como os poliedros de coordenação se agrupam, a fim de minimizar a energia do sólido.
Explicar por que um grupo de átomos se cristaliza em uma estrutura em vez de outra não é tarefa fácil devido à complexidade do fenômeno de ligações atômicas. Podemos estabelecer algumas regras simples, que descrevem quais fatores são determinantes na agregação dos átomos (poliedros de coordenação) e então explicar as estruturas cristalinas observadas. Este procedimento teórico auxilia na compreensão do modo como estruturas cristalinas individuais se relacionam entre si, tanto geométrica como quimicamente.
Idealmente, o arranjo mais estável dos poliedros de coordenação num cristal será aquele que minimiza a energia por unidade de volume ou, em outras palavras, aquele que:
1. preserva a neutralidade elétrica;
2. satisfaz à direcionalidade e ao caráter discreto (1) de todas as ligações covalentes;
3. minimiza a forte repulsão íon-íon;
4. agrupa os átomos o mais compactamente possível, compatível com (1), (2) e (3).
Antes de discutir os arranjos tridimensionais reais formados pelos átomos numa estrutura cristalina, é útil estudar quais arranjos são possíveis para pontos idênticos no espaço. Tais arranjos de pontos são chamados redes espaciais e cada estrutura cristalina é baseada numa das possíveis redes espaciais.

As Redes Espaciais de Bravais (2)

Uma rede espacial é um arranjo infinito, tridimensional de pontos, em que cada ponto tem vizinhanças idênticas. Esses pontos são chamados pontos ou nós da rede. Os pontos da rede podem ser arranjados de 14 modos diferentes, chamados de redes de Bravais. É importante notar que mais de um átomo pode estar associado a cada ponto da rede, mas para cada átomo ou grupo de átomos num ponto da rede deve haver, em outro ponto qualquer da rede, idêntico átomo ou grupo de átomos, com a mesma orientação, a fim de satisfazer à definição de rede espacial.
Como a estrutura do cristal perfeito é um agrupamento regular de átomos, distribuídos numa rede espacial, os arranjos atômicos podem ser descritos completamente pela especificação das posições dos átomos num modelo unitário repetitivo da rede espacial. Tal modelo repetitivo da rede espacial é chamado de célula unitária. As arestas da célula unitária devem ser translações da rede (vetores que unem dois pontos quaisquer da rede), e células unitárias idênticas de uma rede espacial qualquer, quando empilhadas face a face, preencherão todo o espaço e gerarão a rede espacial. Uma rede espacial pode ter várias células unitárias diferentes que satisfaçam aos critérios acima, mas, convencionalmente, escolhem-se como células unitárias as de geometria simples e que contenham poucos pontos da rede. Na Figura 3.a, são apresentados os 14 tipos de células unitárias das redes de Bravais.
Se três vetores não paralelos das arestas da célula forem escolhidos, de modo que os únicos pontos da rede na célula estejam nos seus vértices ou -o que é o mesmo- quando houver somente um ponto da rede por célula (que se pode ver deslocando-se a célula ligeiramente no espaço), a célula unitária é chamada de célula primitiva. Células primitivas são designadas por P na Figura 3.a e são mostradas para três estruturas cristalinas na Figura 3.b.
Nas seções seguintes deste capítulo, algumas das estruturas cristalinas mais representativas são descritas através de suas células unitárias. Quando possível, as estruturas são também descritas utilizando-se os conceitos de ligações químicas e de empilhamento atômico.

Fig. 3-a. As células unitárias convencionais das 14 redes espaciais de Bravais. As letras maiúsculas referem-se ao tipo da célula. Assim, P: célula primitiva; C: célula com um ponto da rede no centro de duas faces paralelas; F: célula com um ponto da rede no centro de cada face; I: célula com um ponto da rede no centro do interior; R: célula romboédrica primitiva. Todos os pontos indicados são pontos da rede. Não há acordo geral sobre a célula unitária a ser usada para a rede hexagonal de Bravais; alguns preferem a célula P, desenhada em linha cheia, outros preferem a linha C, em tracejado.

Fig. 3-b. Células unitárias e células primitivas das estruturas cristalinas CFC, CCC e HC. Os pontos representam posições atômicas, mas são também pontos da rede nas estruturas CFC e CCC. Na célula HC, as posições atômicas no interior da célula não são pontos da rede.